Essa semana, assinei o DisneyPlus e finalmente assisti Soul. A animação fofinha traz muitas reflexões, a maior delas gira em torno do adorado PROPÓSITO.
Sem spoilers, o protagonista da trama (um professor de música estudantil) morre logo após ter a chance de realizar seu grande sonho, sem concretizá-lo. Ele fica desnorteado, pois a todo custo quer voltar à vida para cumprir seu propósito, ser um músico de sucesso. A trama se desenrola de uma forma super envolvente e a conclusão não poderia ser melhor: você não precisa de um propósito para viver e ser realizado! Se desprenda disso!
UFA! Que alívio! Alguns anos atrás eu estudei e me formei coach, desses bem conhecidos. Confesso que não morri de amores pelo conceito, mas valorizo e utilizo muito até hoje várias das técnicas que aprendi. A pulga que ficou atrás da minha orelha desde aquela época foi com relação a encontrar o seu propósito. Alinhar sua razão de existência na Terra, a sua essência, com aquilo que você entrega para o mundo! É lindo, porém, quanta pressão extra isso pode gerar nos reles mortais?
Acredito que o benefício que o alinhamento desses astros pode trazer para qualquer pessoa, não é maior que a pressão pela busca de encontrar esse propósito. Pressão para sermos bem sucedidos, para sermos reconhecidos, para estarmos na capa da Forbes (de preferência Under 30s), para fundar a sua startup de sucesso antes dos 40, para se aposentar antes dos 50... pressão... pressão... pressão! E quem te promete alcançar estas dádivas celestiais: encontrar o seu propósito!
BESTEIRA! Assistam Soul!
Se a gente estivesse focado em usufruir das experiências que nos são dispostas, aprender com elas, independente de estarem ou não alinhadas ao nosso propósito, a vida deixaria de ser uma busca e passaria a ser simplesmente vida! Em Soul, o protagonista se dá conta disso, que passou a vida obcecado buscando por algo, que não fazia diferença alguma na sua realização e felicidade. Bem pelo contrário, o privava de aproveitar o que tinha e as suas conquistas, pois elas não estavam nunca à altura da ilusão que ele mesmo criou sobre o seu propósito.
Para reforçar esse meu argumento Anticoach, quero trazer uma reflexão do Estoicismo, escola filosófica que conta com pensadores como Sêneca, o Imperador Marco Aurélio e o escravo Epicteto, que viveram em épocas e situações distintas: "as únicas coisas que estão sob o seu controle são seus julgamentos, opiniões e valores, é neles que você deve manter seu foco". A arte de usufruir e tirar proveito das situações que você está vivendo, dependem única e exclusivamente de como você as absorve. Encontrar realização e felicidade, não depende de encontrar um propósito, depende de como você significa realização e felicidade.
Resumindo: Você não precisa de um propósito!
Com todo o respeito pela reflexão, sugiro a autora do texto se aprofundar melhor no que consiste um propósito. Não este que é vendido pelas autoajudas e interesses económicos. A contemplação e experiênciação da vida não deixa de ser um propósito. Ler, estudar e entender o que Victor Frankl nos trouxe e contribuiu com seus estudos e fundamentações sobre a Logoterapia, escola por ele fundada, seria um bom começo.
Ter como propósito o bem julgar.
Destarte, fixar e alterar, se necessário, objetivos para viver bem consigo e com o mundo que se coloca ao nosso redor.
Dentro do possível, assim as expectativas serão aliadas, e não um fardo.
Nesta época de idéias rasas e imposições de falsas premissas para o bem viver individual e coletivo, o texto cai como uma luva para alertar sobre o engano do “sucesso a qualquer custo” auto-imposto e, quem sabe, amainar o eventual sofrimento das almas ludibriadas.