Nos últimos dias assistimos discussões acaloradas nas redes sociais sobre os novos formatos para programas de trainee; e dentro de um espaço de fala que também é nosso – já que fomos trainees e hoje, muitas vezes, selecionamos pessoas para essas posições - decidimos elaborar esta carta aberta para reconhecer a trajetória que nos levou a ocupar este espaço e para solidarizar com as mudanças que surgem referentes a este assunto.
Voltando no tempo, há 6 anos atrás iniciávamos nossa jornada, de dois anos, num dos maiores programas de Trainee de uma das mais importantes multinacionais brasileiras. Um momento de muito orgulho e alegria, desde a resposta com a esperada aprovação até cada atividade de desenvolvimento, de reconhecimento por conquistas nos desafios propostos e de exposição a grandes executivos dentro da organização. Na mesma proporção que reconhecemos nosso mérito e esforço ao sermos selecionados neste programa tão concorrido, também reconhecemos que começamos essa corrida muito a frente da grande maioria. Através de muitas desconstruções ao longo destes anos, sabemos que nunca disputamos as vagas com 45.000 candidatos, mas sim com um percentual muito menor deste grupo.
Olhamos para as fotos do passado e ficamos incrédulos com a falta de diversidade entre os aprovados no nosso grupo. Fomos muitos homens, algumas mulheres, poucos negros e quase nenhum PCD ou LGBTQ+. Somos conscientes dos inúmeros privilégios que nos colocaram a frente nesta disputa. Sabemos que apenas nós mesmos, dentro dos padrões que ocupamos, seríamos capazes de cumprir alguns requisitos básicos e de surpreender os recrutadores com alguns diferenciais. Sabemos também que nossos avaliadores se reconheceram na gente, que enxergaram seus próprios filhos, ou até eles mesmos quando estavam começando, e isso também foi uma vantagem competitiva.
Programas de trainee proporcionam experiências incríveis e são famosos por desenvolverem futuros líderes, pessoas que influenciam e são tomadoras de decisões nas esferas em que atuam. Gostaríamos muito que estes espaços e oportunidades fossem acessíveis a todos de verdade. Com a consciência que temos hoje, sabemos que este ciclo precisa ser quebrado, esperamos que os privilégios que nos trouxeram até aqui não sejam mais o ponto de corte daqui pra frente. Além de prestigiar os movimentos feitos por empresas como Magazine Luiza e Bayer, porque eles são sim necessários, nós também nos comprometemos a não depender unicamente deste tipo de iniciativa para trazer mais diversidade as nossas realidades. Gostaríamos de encorajar você, pessoa privilegiada e que entende a importância deste movimento a se comprometer também com isso.
Para finalizar esta carta, queremos convidar a todXs, que por muitos anos não puderam ter este tipo de oportunidade, que aceitassem o desafio de mudar o status quo. Se inscreva nos programas, eles são SIM para você! Não se intimide com quem diz o contrário, sempre vão encontrar argumentos para te desencorajar, não acredite neles! Embora nós não possamos falar de desigualdade, nós reconhecemos que ela é uma verdade e estamos dispostos a lutar contra ela da forma que nos é possível. Boa sorte durante o seu processo, se cuida com o COVID-19 e esperamos ver você conosco muito em breve.
Outubro 2020
Escrito por: Bruna Bartosiaki e Naouel Saadi Assinado por: Ana Reina, Bruno Naccari, Daniel Dottori, Felipe Cabanas, Fernando Cunha, Heitor Tosetto, Nathália Nunes, Nayara Montebello